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martedì 1 dicembre 2015

ENCONTRO COM ROBERTO MASSARI (FUNDAÇÃO INTERNACIONAL ERNESTO CHE GUEVARA), por Carlos Pronzato

DVD de 20 minutos / 2015

Roberto Massari é editor e escritor italiano, fundador e presidente de la Fundação Ernesto Che Guevara (em Acquapendente, província de Viterbo, Itália). É considerado o principal estudioso do Che na Itália. Da Fundação fazem parte alguns dos principais estudiosos do Che no mundo. Nesta entrevista realizada em Acquapendente em outubro de 2014, Roberto Massari fala da importância da Fundação e do Che Guevara.

Carlos Pronzato é escritor e cineasta/documentarista independente argentino radicado no Brasil. Nos seus filmes retrata os conflitos sócio-políticos latino-americanos e as insurgências populares atuais, além de se debruçar sobre aspectos históricos e culturais fundamentais do continente. Alguns de seus filmes são: “Carabina M2, uma arma americana, Che na Bolívia”, “O Panelaço, a rebelião argentina”, “Bolívia, a guerra da água”, “Buscando a Salvador Allende”, “Madres de Plaza de Mayo, memória, verdade, justiça”, “La Rebelión Pinguina, estudiantes secundaristas chilenos contra el sistema”, “Mapuches, un Pueblo contra el Estado”, “Carlos Marighella, quem samba fica, quem não samba vai embora”; “A Partir de Agora, as Jornadas de Junho no Brasil”, entre muitos outros realizados no Brasil e no exterior.
Catálogo: www.lamestizaaudiovisual.blogspot.it

R.M.: Vamos visitar o local da Fundação Che Guevara que fica em Acquapendente e ali você verá tudo o que temos.
Estamos entrando em Acquapendente que fica na província de Viterbo e é também a última grande cidade de Lazio antes de entrar na região da Toscana.
Decidimos colocar a Fundação aqui em Acquapendente porque na época havia um prefeito cujo nome é Tolmino que ainda hoje é membro da Fundação e na época pertencia ao Partido Comunista Italiano. Era um prefeito muito popular escolhido pela maioria da população e que tinha simpatia por Che Guevara. Então conseguimos um local gratuitamente num parque de Jogos Infantis onde chegaremos em breve.
A Fundação foi criada em 1998 aqui em Acquapendente num ato público. No início eram todos italianos, agora não. A Fundação conta com personagens bolivianas, cubanas, polonesas, francesas… Da França temos o Michael Löwy que os latino-americanos o chamam de “Maichel” Löwy. Michael Löwy é fundamental porque o primeiro livro no mundo que foi escrito sobre o pensamento de Che Guevara foi escrito por ele que apareceu na França em 1970, “O Pensamento de Che Guevara”. Então Michael Löwy é membro do Comitê Internacional assim como Carlos Soria Galvarro que é o principal estudioso boliviano do Che junto a Humberto Vázquez Viaña, que infelizmente morreu há pouco tempo. Humberto Vázquez e Carlos Soria representam a totalidade do conhecimento que temos sobre o Che Guevara na Bolívia.
Podemos dizer que o trabalho deles foi desenvolvido com plena autonomia, com espírito livre dizendo as coisas necessárias colocando também os erros do Che, os erros de Cuba. Na nossa Fundação se pode muito bem falar a favor ou contra o Che, o importante é que seja feito com seriedade, com documentos, com materiais verificáveis e o resultado é que temos recolhido centenas de pesquisas sobre o Che entre 1998 e hoje. Todas estas pesquisas são publicadas nos Cadernos da Fundação. O arquivo da Fundação é parte do Jardim das Rosas.
O meu interesse por Guevara é o mesmo de muita gente. Nos anos 1960 eu era um militante político revolucionário e normalmente a imagem do Che era um símbolo, era uma referência.
Este é o local da Fundação Che Guevara, fundamentalmente uma biblioteca, uma biblioteca-arquivo onde encontramos livros, revistas, manifestos, mas a parte mais importante que eu espero desenvolver até o fim é a parte dos livros dedicados ao Che. Deste ponto de vista posso dizer que é o maior consunto de livros dedicados ao Che que existe no mundo. Não de livros do Che, já que sobre isto é imbatível a Biblioteca José Martí de Havana. Temos também as revistas dedicadas ao Che, algumas destas são impossiveis de achar. Eu tenho o prazer de apresentar a coleção completa da Revista Pensamento Crítico, que foi editada em Cuba entre fins de 1960 e 1970.
Na Itália as edições Feltrinelli se transformaram numa raridade, aqui na Fundação temos duas cópias dos quatro volumes.
A primeira biografia do Che foi escrita por (Hugo) Gambini, esta é a nova edição do livro de Gambini. Temos a velha edição fotopiada. Pode ver? Está aqui. Esta é a fotocópia da edição antiga de Gambini.
Em julho de 1968 fui a Cuba, fiquei 6 meses como hóspede do governo cubano, o que significa que tive a possibilidade de visitar todos os aspectos interessantes da Revolução, da Sierra Maestra às fábricas; mas particularmente nasceu uma grande amizade com Hilda Gadea, a peruana, a primeira esposa do Che. Isto foi algo decisivo na minha vida que me fez aproximar qualitativamente à figura do Che e não somente ficar impressionado pela sua obra. Desta grande amizade com Hilda Gadea nasceu um conhecimento do perfil humano do Che e estamos falando de 1967-1970, quando do aspecto humano do Che ninguém se ocupava, ainda só se falava do Che guerrilheiro, do Che da Bolívia, do Che da Sierra Maestra. Então, através de Hilda comecei a enxergar uma outra imagem do Che.
Livros do Che, não que sejam raríssimos, mas, por exemplo, quem compra “Guerra de Guerrilhas” em Cuba normalmente compra esta edição que é uma edição comercial, dificilmente encontra a edição de 1959 que foi feita pelas Forças Armadas Cubanas.
Aqui embaixo temos todos os filmes imagináveis, temos a partitura de Carlos Puebla autografada com a sua caligrafia musical e as notas de “Hasta Siempre (Comandante)”.
São anos de fermentação de um processo que no meu caso explode nos anos 1980 quando escrevo o livro “Pensamento e Política da Utopia”, aqui a capa da 5ª edição. Devo dizer que é o primeiro livro que saiu na Itália sobre o Che da nova geração e não dos livros de 1968/69. Este é um livro de 1987. Precede a loucura editorial que chegou a publicar na Itália 186 títulos que tem a ver com o Che. Eu por sorte me antecipei à moda com este livro que também foi traduzido por companheiros do País Vasco da Editora Txalaparta. O sucesso deste livro em edição primeiro italiana e depois espanhola nos deu a vontade e a coragem de começar a contatar pelo mundo os principais estudiosos do Che Guevara. E isto tem tomado o meu tempo desde fins dos anos 1980 até os anos 1990, até que se tornou a decisão de dar vida a Fundação Ernesto Che Guevara.
Uma parte interessante aqui são os materiais fotográficos e aqui há também fotografias e retratos dedicados ao Che. Aqui é o setor bibliografia e temos a bibliografia cubana. Temos também obras em outras línguas, servo-croata, tcheco… Esta é a primeira edição do livro de (Regis) Debray, “Revolução na Revolução”. Aqui temos o boletim da Tricontinental.
A única coisa que não tenho interesse em colecionar são as ficções sobre o Che, que me interessam menos porque tem saído autenticas porcarias onde o nome do Che Guevara as vezes aparece só no título e não está na obra. Se as enviam eu as coloco na coleção, mas eu não as procuro.
Aqui são os Cadernos da Fundação Che Guevara, temos 8 números, falta só o que saiu há pouco… Os Cadernos são a obra fundamental da Fundação Che Guevara: chegamos ao Caderno número 9, um tem em torno de 400 páginas e contêm centenas de pesquisas sobre o Che. Mas sobre qual Che? Sobre diversos aspectos do Che. Dou um exemplo: nós achamos a entrevista entre o Che e o (Marechal) Tito, que, se me permitem, é um texto histórico fundamental. Um estudioso do Che que seja sério não pode ignorar os Cadernos da Fundação Guevara. Não nos esqueçamos que esta Fundação é um Centro de Estudos, aqui chegam estudiosos de todo o mundo.
Recentemente veio aqui David Kunzle, membro da Fundação Che Guevara, professor de História da University of California de Los Angeles. Esteve aqui 2 dias procurando tudo aquilo que pudesse achar sobre a relação entre Che Guevara e Jesus Cristo, um livro sobre a “cristificação” da figura de Guevara e “guevarização” da figura de Cristo. Um livro interessantíssimo. Estamos falando de um professor da University of California de Los Angeles, mas muitos italianos que fazem a tese sobre o Che Guevara vêm aqui.
E sobre a lenda que diz que foi Feltrinelli que descobriu a o foto de (Alberto) Korda aqui se demostra que é falsa. Nós descobrimos que a foto de Korda foi publicada em agosto de 1960 no jornal Revolução… onde se anunciava uma conferência do Che. A mesma foto será republicada no jornal em abril de 1961 para anunciar outra atividade do Che. Assim a lenda que foi publicada sobre a descoberta de Feltrinelli é falsa. E aqui temos a foto cortada assinada por Korda. E Korda não sabia que na foto original, a que não está cortada, o perfil que tem é o de Jorge Masetti. Esta é a verdadeira foto de Korda e aparece Jorge Masetti. Esta é uma descoberta da Fundação Che Guevara da qual estou orgulhoso, porque são descobertas realizadas numa grande distância de anos.
E aqui está Masetti. Sim, aqui temos o livro histórico “Os que lutam e os que choram”.
Verdadeiramente é necessário que exista um Centro de Estudos sobre o Che Guevara, um Centro de Estudos que faça os estudos e não que use a palavra estudo só no nome, não, aqui nós não estamos para fazer dinheiro publicando as obras do Che, aqui publicamos pesquisas. Repito, são centenas de pesquisas realizadas no Leste Europeu, na América Latina, na França, na Polônia, na Itália que são publicadas nos Cadernos da Fundação.
Resumindo, temos trabalhado unindo esforços ao redor do mundo, isto completamente fora de intenções comerciais. Ao invés disso, como Fundação Che Guevara, estamos muito sentidos por não ter sido feita uma edição crítica das obras do Che. Eu a proponho desde final dos anos 1980, eu tinha ótima relação com o Instituto do Livro de Havana, particularmente com uma personalidade que tenho prazer em lembrar, o Pablo Pacheco, falecido há pouco tempo. Se pensou em trabalhar seriamente sobre o Che. Isto não foi possível porque o critério comercial e a necessidade de fazer dinheiro prevaleceu lamentavelmente, inclusive uma figura como a de Guevara, que podemos considerar em épocas modernas como o maior inimigo do dinheiro, da comercialização, e também há publicações onde o Che se manifesta contra o copyright e o direito de autor.
Me perguntam sempre: porque Guevara hoje? A resposta é fácil e difícil ao mesmo tempo. Difícil porque Guevara representou uma época, um período da História que não se repetirá. Representou também todas as ilusões que tínhamos com a Revolução Cubana, com a Revolução do Terceiro Mundo, ilusões que já não tem mais razões de existir. Este é o aspecto difícil. O aspecto fácil é que Guevara se apresenta de uma maneira que nenhum outro homem político teve na História do Século XX. Guevara vai de encontro diretamente com o problema da ética. Guevara não nos oferece ensinamentos de estratégia, de análise político-econômica, mas nos dá ensinamentos de ética. É a coisa fundamental que hoje falta na política. Guevara demonstrou pela primeira vez na história que se pode chegar ao poder e não ser intoxicado pelo poder. Se pode chegar ao poder e ter a coragem de largá-lo. Devemos levar em conta que ele era o número 2 do aparelho, do ponto de vista externo era o embaixador da Revolução Cubana, ministro da Economia e abandonou tudo isto para seguir atrás de uma idéia. Guevara representa a última grande esperança do século XX. Eu não encontro outro exemplo, não há outro exemplo de um político que chegando ao poder seja capaz de não se deixar intoxicar pelo poder. O poder é um veneno, um veneno terrível que invade a cabeça, a consciência, os escritos, as ações de todos os homens políticos que chegaram ao poder; e estou falando do poder de Estado, obviamente, porque há um discurso diferente sobre o micro poder como o entendia (Michel) Foucault. Guevara nos deu esta bandeira, uma bandeira fundamentalmente ética, e tem demonstrado que por esta ética se pode escrever, se pode lutar, se pode vencer… e se pode perder.
O problema aqui é muito sério. O espaço está lotado. Tenho doações de livros sobre o Che, sobre Cuba, sobre o período latino-americano, duas sacolas por ali, 12 sacolas por aqui, em total são 14 sacolas ou caixas com livros que esperam ser classificados, valorizados. Eu não consigo mais espaço aqui e tenho necessidade de achar outro local. Gostaria de achar esse novo local ao lado de uma grande Biblioteca do mundo, e não necessariamente italiana: esta não é uma coleção italiana, é uma coleção internacional e então se a achar em Paris, em Washington, em Havana, em Rosário ou no Rio de Janeiro seria ótimo, porque não quero que esta coleção de livros termine com a minha morte, não, gostaria que continuasse.

Acquapendente, Italia, 23 de Outubro 2014

(Tradução: Tadeusz Pronzato)

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